You Could Be Happy - Parte I

Estou quieta. Tem uma música de ninar tocando alto, porque eu coloquei um daqueles cds pra fazer bebê dormir pra tocar. Por que eu tenho um cd de fazer bebê dormir? Porque eu queria muito ter um filho. Mas eu estragei tudo. Eu deixei ele ir. Deixei ele me olhar com lágrimas nos olhos e virar as costas pra mim. Hoje eu penso que deveria tê-lo impedido de sair pela porta. Queria ter corrido e agarrado ele ali no mesmo, no meio da sala. Essa lembrança sempre vai me perseguir. Eu era apenas uma estúpida menina vivendo numa estúpida cidade pequena que tinha o estúpido sonho de crescer e ir embora. E eu achei que tinham coisas demais me atrapalhando. Inclusive o meu amor. O amor que eu sentia por ele era tão, mas tão grande, que toda vez que eu pensava em ir embora eu me lembrava do cheiro das panquecas com mel que ele fazia pra mim no café da manhã, e do cheiro de leite que ele exalava. Eu me lembro de cada pequeno detalhe. Queria não me lembrar, mas é impossível, porque tudo que eu tenho possui o cheiro dele. O miserável me deixou presa num apartamento onde tudo me lembra ele. Ele me faz mais feliz do que eu jamais fui, e eu fui burra o suficiente pra dizer na cara dele que ele estava me segurando naquela vidinha patética. Não era ele, era eu. Ele ainda foi corajoso o suficiente pra me dizer que queria que eu fosse feliz, e fizesse tudo que eu sempre quis fazer. Acho que ele pensou que eu desabaria ali mesmo (quase desabei. Me fiz de forte na hora errada, como sempre). Ele foi embora e eu fiquei. Mudei de cidade na outra semana. Mas não fui feliz como achei que seria. Não havia panquecas frescas com suco de laranja esperando por mim. Não havia piquiniques no parque todo domingo. Não havia ninguém pra segurar minha mão e me fazer carinho na bochecha. Havia, sim, a agitação e vida pela qual eu esperei. Mas descobri que nada disso importava. Eu acho que morri no dia que me dei conta de tudo isso.

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